Empreendedorismo: Comunidade amazônica cria plano de negócios para aproveitar potencial turístico
fevereiro, 07 2019
Custo da viagem ficou em R$ 4.350 e prevê visita a cachoeiras, banhos de igarapés, observação de fauna e trilhas na mata
Por José Cerqueira* e Jorge Eduardo DantasAproveitar o potencial turístico de rios, cachoeiras, trilhas e bosques é uma das maiores oportunidades de geração de renda existentes para as comunidades ribeirinhas e tradicionais da Amazônia.
Por isso, há anos o WWF-Brasil apoia iniciativas deste tipo, buscando aliar a inclusão social das comunidades com a conservação da natureza e o uso responsável dos recursos naturais.
Pois recentemente uma das comunidades apoiadas pelo WWF-Brasil – a Barra de São Manoel, situada na interseção entre os estados do Amazonas, do Mato Grosso e do Pará - deu mais um passo em direção à promoção do turismo sustentável: eles concluíram, depois de meses de discussão, um plano de negócios para suas atividades turísticas.
Roteiros
Elaborado entre abril e agosto de 2018, este plano de negócios será um instrumento para ajudar no desenvolvimento sustentável daquela comunidade.
Hoje, a Barra de São Manoel recebe visitantes em caráter experimental, para ajudar a desenhar e refinar os roteiros, atrações e serviços que eles vão oferecer.
No plano de negócios, os comunitários estabeleceram dois roteiros de visitação, cuja duração varia entre 5 e 7 dias, de acordo com o período do ano. Eles estabeleceram o preço de R$ 4.350 para a viagem, considerando pequenos grupos de 3 viajantes que saem ou de Apuí (AM) ou de Alta Floresta (MT). Estão incluídos neste valor alimentação, deslocamentos terrestres e fluviais dentro e nas proximidades da comunidade.
Os roteiros contemplam visitas a cachoeiras (do Roncador e São Benedito), pernoite na cachoeira do São Simão, observação de fauna no Barreiro das Antas, trilhas dentro da mata, observação de pinturas rupestres, visita a áreas de produção (seringueiras, copaíbas, casa de farinha), banhos de rios e igarapés, passeios de canoa, mesas redondas e bate-papo com moradores locais e apresentações culturais.
O plano de negócios trata também da repartição de benefícios: como os lucros serão divididos, considerando que diferentes profissionais estarão envolvidos, como piloteiros, cozinheiras, pescadores e guias turísticos.
Produtos e serviços
“O plano visa identificar, com mais clareza, os produtos e serviços ofertados pela comunidade, o mercado em que ela quer se inserir e as atitudes necessárias que devem ser tomadas pelos empreendedores que trabalham com esta atividade econômica”, explicou a analista de conservação do WWF-Brasil Karen Pacheco.
De acordo com a especialista, este plano traz também mais segurança para os empresários, de dentro e fora da comunidade, que queiram iniciar, ampliar ou promover negócios que se relacionam com as atividades turísticas. “Assim, os operadores do turismo na Barra de São Manoel buscam alcançar um mercado mais amplo e aumentar sua demanda de visitantes e turistas”, disse Karen.
Cerca de quinze moradores da Barra de São Manoel estiveram diretamente envolvidos na elaboração do plano de negócios. As atividades turísticas ajudam diretamente 40 famílias e auxiliam na proteção de mais de 4,3 milhões de hectares no interior da Amazônia.
Construção coletiva
A turismóloga Ana Gabriela Fontoura, da empresa Estação Gabiraba, foi a facilitadora do processo de construção do plano de negócios.
“A comunidade pensar estrategicamente o planejamento e o desenvolvimento do turismo em seus espaços é um dos princípios do Turismo de Base Comunitária no qual acreditamos. A experiência de construção coletiva na Barra de São Manoel tem sido de grande aprendizado e o roteiro criado por eles nesse cantinho da Amazônia é sensacional”, contou Ana Gabriela.
Para uma das moradoras da Barra de São Manoel, a indígena Glória Paygõ, da etnia Munduruku, o plano de negócios tem potencial para trazer muitos benefícios para aquela comunidade. “Esse plano cria novas opções de renda e traz diferentes conhecimentos para nós. Existe um potencial de termos mais visitantes e de vendermos produtos, o que é muito bom”, afirmou.
O trabalho com o turismo de base comunitária na Barra de São Manoel é feito em parceria com a Secretaria Estadual de Meio Ambiente do Amazonas (Sema-AM) e o Instituto Chico Mendes de Conservação da Biodiversidade (ICMBio).
Ciclo da borracha
A Barra de São Manoel é uma comunidade surgida em 1901, resultado dos fluxos migratórios ocorridos na Amazônia durante o ciclo da borracha, no início do século XX. A comunidade fica no município de Apuí (AM) mas, devido à distância em relação a esta cidade, também recebe assistência de Jacareacanga, município do sudoeste do Pará.
Ela fica entre o Parque Nacional do Juruena e o Mosaico do Apuí, duas áreas protegidas que, somadas, ajudam a proteger mais de 4,3 milhões de hectares de floresta amazônica. O WWF-Brasil desenvolve projetos de conservação da natureza naquela área há mais de uma década.
*Estagiário sob supervisão de Jorge Eduardo Dantas e Denise Oliveira