Mineração é motivo para reduzir áreas protegidas também no sudoeste do Pará
agosto, 31 2017
Emendas ao PL 8107 colocam em risco mais três unidades de Conservação, cerca de um milhão de hectares.
Não é só na região da Reserva Nacional de Cobre e Associados (Renca), entre Pará e Amapá, que áreas protegidas estão sob ataque para beneficiar a mineração. A Floresta e o Parque Nacional de Jamanxim, no sudoeste do Pará, também estão na mira.Após o governo apresentar ao Congresso em regime de urgência o Projeto de Lei (PL) 8107/17 para reduzir a proteção de Jamanxim, deputados propuseram 12 emendas, ampliando a área afetada e tornando a proposta ainda pior: cerca de um milhão de hectares de áreas protegidas pode ser perdido – quase duas vezes o território do Distrito Federal.
"Isso reforça a nossa tese de que não temos atualmente no Congresso um ambiente que permita um debate qualificado, baseado em argumentos técnicos e consulta pública à sociedade para que as tomadas de decisão favoreçam de fato um desenvolvimento ambientalmente sustentável e socialmente justo para a Amazônia" afirma Mariana Ferreira, coordenadora de Ciências do WWF-Brasil.
Tudo isso para beneficiar invasores de terras públicas, desmatadores, madeireiros ilegais, garimpeiros e até mesmo mineradoras que estão de olho na região paraense da BR-163. Essa área é historicamente marcada pela ação de grileiros, conforme demonstrado em diversas operações de fiscalização realizadas pelo Ibama e por outros órgãos, entre 2008 e 2016 (Boi Pirata, Castanheira, Rios Voadores, Onda Verde, entre outras).
O alerta foi dado por 11 redes e organizações socioambientais: Grupo de Trabalho pelo Desmatamento Zero, Coalizão Pró-UC, Greenpeace Brasil, Instituto Centro de Vida (ICV), Instituto de Manejo e Certificação Florestal e Agrícola (Imaflora), Instituto de Pesquisa Ambiental da Amazônia (Ipam), Instituto do Homem e Meio Ambiente da Amazônia (Imazon), Instituto Socioambiental (ISA), Rede Pró-UCs, The Nature Conservancy (TNC) Brasil e WWF-Brasil.
As ONGs assinaram em conjunto uma nota técnica dizendo que a alteração dos limites de Jamanxim se junta a outras medidas do presidente Temer que enfraquecem a política ambiental para conter o aumento do desmatamento na Amazônia. “A redução da Flona do Jamanxim faz parte de uma estratégia mais ampla de desmonte do Sistema Nacional de Unidades de Conservação, o SNUC, e da legislação ambiental”, informa a nota.
Confira aqui a nota completa
O texto original do PL pretende reduzir a Flona de Jamanxim em 354 mil hectares, mas as emendas retalham mais três Unidades de Conservação. Na Flona de Jamanxim, dentro da área que se pretende transformar em APA - categoria de Unidade de Conservação que pode abrigar propriedades privadas e atividades agropecuárias – há 125 processos minerários.
A parte da Flona de Itaituba II a ser transformada na APA Trairão contém 27 processos minerários, abrangendo mais de 137 mil hectares ou 90% de sua área. A parte do Parque Nacional (Parna) de Jamanxim – a ser transformada na APA Rio Branco (101 mil hectares) – apresenta cobertura florestal extremamente preservada (99%), mas sofre com atividade garimpeira ilegal. Entre os minérios mais procurados, estão o ouro e diamante.
No caso do Parque Nacional do Jamanxim a redução da proteção é extremamente grave porque vai estimular o desmatamento na última faixa de floresta remanescente que conecta as bacias do Xingu e Tapajós, uma das regiões com maior biodiversidade na Amazônia. “O desmatamento nessa região vai acelerar a fragmentação da floresta amazônica, comprometendo não apenas a biodiversidade, mas também o papel que a floresta desempenha na regulação climática e na manutenção do regime de chuvas”, diz a nota das ONGs.
"Vale lembrar que o Parque Nacional do Jamanxim é uma das UCs apoiadas pelo Programa Arpa, um programa do governo federal, estados e demais parceiros em prol da conservação de 60 milhões de hectares da Amazônia brasileira. Muitos recursos já foram investidos para a estruturação dessas unidades", ressalta Mariana Ferreira.
Mais desmatamento e grilagem
De acordo com as organizações, se o PL for aprovado, o desmatamento na região alcançaria aproximadamente 202 mil hectares de floresta até 2030. Isso representaria uma emissão de aproximadamente 70 milhões de toneladas de gás carbônico. O Brasil estaria, literalmente, queimando US$ 350 milhões, tomando-se o valor de US$ 5 por tonelada de carbono que o Fundo Amazônia adota.
A justificativa do governo de que a redução da área atenderia a pequenos produtores rurais tampouco se sustenta. Na Flona Jamanxim, o tamanho médio das áreas requeridas para a regularização é de 1.700 hectares, ou seja, quase 23 vezes o que seria um lote de 75 hectares que caracteriza uma propriedade da agricultura familiar naquela região.
Conforme a nota, as emendas ao PL representariam, ainda, um subsídio de pelo menos R$ 1,4 bilhão a grileiros, que poderiam regularizar áreas ilegalmente ocupadas por valores até 90% menores que os praticados no mercado.
Medidas provisórias
Desde o final de 2016 Michel Temer vem tentando reduzir a Flona do Jamanxim, inicialmente por meio de Medidas Provisórias (MPs 756 e 758) e agora por projeto de lei. A novela das MPs, lançadas e vetadas por Temer, chegou a um final: na noite desta quarta-feira (30), o Congresso manteve o veto às medidas.
Mas foi por pouco. Os vetos eram mesmo só para Norueguês ver. Um jogo de cartas marcadas.
Quase 600 mil hectares de áreas protegidas na Amazônia e na Mata Atlântica estavam em risco de serem liberadas para acomodar, em sua maioria, ocupações irregulares em Jamanxim e até mesmo no Parque Nacional de São Joaquim, em Santa Catarina – uma das emendas inseridas na medida como jabuti durante a análise do Congresso.
Segundo as ONGs, a redução de florestas “virou moeda de troca” entre o governo e parlamentares da bancada ruralista.
Em julho, campanha contra a redução de áreas protegidas também ganhou o reforço do jornalista e apresentador Marcelo Tas e do diretor e ator peruano radicado no Brasil, Enrique Díaz, que participaram de um vídeo no qual criticam a proposta (assista aqui)
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