Regiões preservadas são alvo do tráfico de animais
dezembro, 05 2012
38 milhões de animais silvestres são retirados todo ano da natureza brasileira, especialmente aves.
por Aldem BourscheitBrasília (DF) - Minas Gerais é o estado que mais contribuiu para a quantidade de multas aplicadas ao tráfico nacional de animais silvestres entre 2005 e 2010, especialmente de pássaros como canário-da-terra-verdadeiro, coleirinho, trinca-ferro-verdadeiro, curió e azulão. As maiores vítimas da ilegalidade são espécies canoras ou de grande beleza que acabam em gaiolas como animais de estimação, e também as mais procuradas por criadores comerciais e amadores.
O grande número de multas registrado em terras mineiras se deve à atuação da Polícia Militar Ambiental, conforme artigo publicado por analistas do Ibama no livro Enriquecimento da biodiversidade em um mundo diverso (atalhos para download ao lado). O estudo também traça as principais rotas usadas pelo tráfico (confira o mapa) para retirar animais de onde a natureza está preservada e vendê-los em centros urbanos.
Pelo alto grau de conservação, com mais de oito em cada dez hectares cobertos por Cerrado no norte de Minas Gerais, o Mosaico de Unidades de Conservação Sertão Veredas-Peruaçu está na mira dos traficantes. Parte dele toca o sudoeste baiano, onde a venda ilegal acontece principalmente ao longo da BR-116, com sérios impactos para aves nativas. No Mosaico é encontrada a maioria do animais conhecidos do Cerrado, muitos ameaçados de extinção pelo desmatamento e pelo avanço descontrolado da agropecuária e obras de infraestrutura.
No fim de setembro, foram apreendidos 62 papagaios na Serra das Araras, distrito de Chapada Gaúcha (MG). Os animais estavam em situação precária, em caixas de madeira no porta-malas de um carro. Os dois detidos são de Januária (MG), mas venderiam os papagaios em São Paulo, de acordo com a Polícia Militar Ambiental. As aves foram entregues ao Instituto Chico Mendes de Conservação da Biodiversidade em Chapada Gaúcha. Um dos traficantes é reincidente no crime, mas ambos foram liberados.
“Os grandes remanescentes do país são o principal alvo da coleta ilegal de animais silvestres. O Mosaico Sertão Veredas-Peruaçu é muito procurado pelos traficantes durante a reprodução anual dos psitacídeos (papagaios, araras e outras espécies de bico torto)”, disse um dos autores do estudo, Guilherme Gomes Destro, da Coordenação de Operações de Fiscalização do Ibama.
O sargento da PM Eduardo Ferreira afirma que crimes ambientais são comuns na região. "Infelizmente sabemos que aqui (no Mosaico) o tráfico de animais silvestres e a caça são corriqueiros. Procuramos desenvolver trabalhos de educação e fiscalização, mas para chegarmos aos criminosos é muito importante que a comunidade nos ajude", disse ao portal G1.
De acordo com Júlio César Sampaio, especialista em Cerrado do WWF-Brasil, o tráfico na região demonstra a necessária consolidação das áreas protegidas e o fortalecimento de ações conjuntas que levem à redução de práticas danosas ao meio ambiente.
“O Mosaico é uma das regiões mais importantes para a conservação da biodiversidade, de culturas e de economias únicas do Cerrado. Governos, sociedade civil e setor privado precisam unir esforços para evitar que a região tenha o mesmo fim que metade do Cerrado, hoje totalmente desmatado”, ressaltou.
Números alarmantes
Cerca de 38 milhões de animais silvestres são retirados todo ano da natureza brasileira, principalmente aves. Apenas quatro milhões são vendidos, principalmente na Região Sudeste, onde se concentra a demanda por animais traficados. O restante acaba em gaiolas, é solto ou morre vítima do tráfico ou maus tratos. Aprisionar ou vender animais silvestres é uma prática ilegal, mas comum em todo o Brasil.
O comércio ilegal de vida silvestre é estimulado pela procura de zoológicos e colecionadores, petshops e indústrias e também para pesquisa e biopirataria. As redes de escoamento de animais silvestres adotam métodos semelhantes aos usados por traficantes de drogas, armas e pedras preciosas para falsificar documentos, subornar, sonegar impostos e definir rotas de transporte nacional e internacional.
A Rede WWF desenvolve uma campanha internacional contra o comércio ilegal ou insustentável de animais silvestres e subprodutos. Junto com a União Internacional para Conservação da Natureza, desenvolveu um programa de apoio à Convenção Internacional sobre o Tráfico de Espécies Ameaçadas da Fauna e da Flora Silvestres (Cites, sigla em Inglês).
Toda ave tem uma função no ambiente natural, por exemplo, dispersando sementes que manterão a saúde das florestas ou controlando populações de insetos, muitos incômodos às pessoas, lembra o especialista em aves e analista de Conservação do Programa Amazônia do WWF-Brasil, Luiz Coltro. Além disso, ele ressalta que a coleta e o comércio ilegais podem levar espécies à extinção, pela redução ou empobrecimento genético das populações.
“As aves não cometeram nenhum crime para terminar a vida atrás das grades”, lembrou.